sábado, 17 de abril de 2010

(2010/093) Estudantes "noturnos"


1. Fui estudante "noturno". Uma nação só "tolera" cursos noturnos, quando decide que não vai dedicar-se fundamentalmente à formação cultural, técnica, moral, científica, espiritual de seu povo. Todos os esforços deveriam ser envidados para que a educação fosse prioridade de um povo. Cursos noturnos pressupõem estudantes que trabalham o dia todo, e reservam as três horas da noite para estudar. Até dá. Eu fiz isso. Mas não se pode dizer que se trate de um modelo ideal. Eu diria, contudo, até em defesa de minha formação, que a gente aprende a tirar leite de pedra, se vira, e acaba conseguindo reunir um pouco aqui e um pouco ali de conhecimento. Conseguimos até nos sair melhor do que muita gente que teve a oportunidade de estudar de manhã e, porque, de alguma forma, tem sustento, tem o dia todo para os livros, a reflexão, a pesquisa. Todavia, isso acontece por causa de uma extraordinária dedicação do estudante noturno - quando ele é dedicado, claro, porque há alunos norturnos que são tão murrinhas quanto alguns alunos matinais. Mas é a força de vontade, a dedicação, a perseverança, mais do que a extraordinária capacidade pessoal, o que também aí se encontra, que faz de alunos noturnos exemplos de superação.

2. O ideal seria uma educação absolutamente voltada para a formação em tempo integral. Com aulas num período, pesquisa e relatórios em outro. Para muitos estudantes, isso é possível. Na Colina, por exemplo, há alunos que estudam de manhã, e têm a tarde toda livre para pesquisas e leituras. O estudante que ganha esse presente, esse privilégio, e não se aproveita dele, não o usufrui até a última gota, comete dois pecados - contra si e contra seus irmãos, que não têm o mesmo privilégio. Sua formação deveria ser a melhor de todas, seus trabalhos, impecáveis, seus conhecimentos, máximos. Ele tem tempo! E o tempo é o pai e a mãe da formação adequada... Mas, às vezes, quanto desperdício...

3. Mas quero falar do estudante noturno da FABAT. Geralmente, eis o seu perfil: trabalha o dia todo, às vezes, até sábado, é casado, é membro "ativo" de igreja. Pensemos sobre isso. Trabalha o dia inteiro e estuda à noite. Dorme umas cinco - se tanto - horas por dia. Era meu caso. Felizmente, trabalhava, morava e estudava na mesma cidade, e isso me dava alguns minutos a mais de sobra, que eu não perdia no trânsito. Então, eu estudava meia-hora, no almoço, todo dia, e, de noite, antes de dormir, mais meia-hora, às vezes, uma hora. Isso era sagrado. Mesmo depois que casei - casei no primeiro ano de seminário...

4. Não dá para fazer um curso com seriedade apenas com esses períodos de estudo. Se o sujeito não trabalha sábado, está salvo. Dedica metade de seu sábado à família e metade aos estudos. Sem negociações. Se trabalha, pior pra ele, vai ter que dividir - e tem de dividir - o domingo. Para quem trabalha sábado e é membro de igreja, eis a fórmula: noite de sábado, de um lado, metade do domingo de outro, e a segunda metade do domingo, de outro. Para a igreja, dedica ou a manhã ou a noite de domingo. A outra metade do domingo e mais a metade do sábado, escolhe o que fica para o estudo e o que fica para a família. O estudante que trabalha sábado não deve dedicar o domingo todo às atividades da Igreja. Se fizer isso, ficará apenas com a noite de sábado para dividir entre os estudos e a família. Logo, logo, alguém está reclamando, com razão, de falta de atenção, de cuidado, de afeto - e de coisas mais! -, com o casamento em frangalhos. Por isso, parte do domingo deve ser transferida ou para a família, ou, se a família receber o sábado, para os estudos.

5. Não me culpem pelas orientações. É a sua formação que está em jogo - é seu futuro. Se você não se dedicar à sua formação agora, vai se dedicar quando a ela? Estar na Faculdade não garante em nada a sua boa formação - é sua dedicação aos livros, à pesquisa e à reflexão que garante sua boa formação. Mas, se você não lê, não pesquisa, não reflete sobre as questões que estuda e pesquisa, como pode aprofundar e aprimorar a sua formação?

6. Não dedique a sobra de seu tempo à sua fomação. Não estabeleça um padrão de "resto" para aquilo que, nesse momento, é sua principal atividade: preparar-se para seu futuro próximo. Claro que "canudos" podem até abrir portas - mas não fazem de você uma pessoa melhor. Isso, só o estudo, a pesquisa, a reflexão - filhos do tempo que você se concede.


OSVALO LUIZ RIBEIRO
Coordenação Geral Acadêmica

5 comentários:

  1. Excelentes reflexões tomarei a liberdade de compartilhar com os professores do STBNB, SEC e AMESPE, locais onde sirvo.
    Fraterno abraço,

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  2. Este texto, pra mim, é resposta de oração, tipo: você não está sozinha! rs. Acredito que para a mulher é um pouquinho mais complicado, marido e filhos, casa e trabalho e uma vontade tremenda de aprender. Das onze matérias de Teologia, faço quatro e, ainda assim, sinto dificuldades. Agora fico tentando imaginar como será no próximo semestre que desejo fazer todas disciplinas... mas basta a cada dia o seu mal. Agora, por exemplo, marido e filhos: festa de família. Eu: estudando antropologia. Algumas lágrimas, momento de oração e uma enorme vontade de tirar um Dez na prova!

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  3. Liana, sua reação é belíssima. E você me faz penitenciar-me por não ter pensado como é ainda mais difícil a presença de mulheres "noturnas". Não é preciso que ninguém aponte meu erro, eu mesmo o aponto: eu só pensei em homens e falei como um deles. Esqueci que é ainda muito mais incoparavelmente difícil para vocês. E você foi muito gentil em me lembrar isso de modo amigável. Obrigado. Você está certa. Certíssima. E oxalá consiga seu dez!

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  4. Interessante, Osvaldo, eu também fui estudante noturna nos cursos que fiz ligados à Língua Portuguesa. O único que fiz pela manhã, Direito, não me levou à frente na vida, em termos profissionais.Casei-me no segundo ano de faculdade, tive a primeira filha no terceiro ano, engravidei de novo no quarto. Mas, se me lembro bem, todos nós tínhamos muita garra, justamente por isso. Eu estudava na Tijuca, dava aulas em Pavuna e morava no Irajá. Fazia um tour pela cidade. Mas tudo que aprendi , de verdade, para minha vida, foi nos cursos noturnos. Qunado li sua página, reparei que não havia professores sem ânimo. Só um era cansadinho, mas aquele seria cansado, até se desse aulas deitado na rede, em frente ao mar, com um suco gelado na mão. Ele não tinha vocação para professor. Tudo isso me levou a pensar que as dificuldades nos impulsionam para a frente, enquanto as facilidades, às vezes, nos deixam preguiçosos. Mas devo lembrar que temos alunos da manhã que também trabalham e têm todas as dificuldades dos da noite. Resumo da ópera: não é o horário em que se estuda, é a luta pessoal que importa, levando-nos ao sacrifício para superar exatamente a luta que cada um de nós tem. Minha mais velha nasceu em um domingo. Na sexta-feira antes, às 22:30, eu peguei um ônibus no meio de uma ventania, que encheu minha bata e eu quase caí do ônibus de volta. Que barrigão! Mas eu já tinha feito a nota para passar de ano, desde setembro, pude ter meu resguardo e não fiquei devendo nota. Naquele tempo, éramos pobres, não tínhamos carro, não dava para o táxi. Pedro trabalhava muito, pois ele também fazia faculdade à noite. Mas vencemos! todos podem vencer, se estudarem se sacrificarem e não ficarem lamentando as dificuldades, pois elas são o aguilhão que impulsiona! Fiquei feliz de lembrar dessas coisas. Olhando agora, parece que seria impossível, mas não foi!... E não será para nossos alunos que o quiserem também!!! Que bom, lembrar disso tudo! Grande abraço da Celeste. BONS ESTUDOS NOTURNOS A TODOS E TODAS! E DIURNOS TAMBÉM!!!

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